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Contas conjuntas e herança — quem é o verdadeiro dono do dinheiro neste tipo de contas?
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Contas conjuntas e herança — quem é o verdadeiro dono do dinheiro neste tipo de contas?

26 de agosto de 2025 às 14:045 mins
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A morte de um titular levanta sempre dúvidas sobre contas conjuntas ou solidárias: quem pode movimentar e quem é o verdadeiro dono do dinheiro? Explicamos as presunções legais, a jurisprudência recente e o que os herdeiros devem fazer para garantir uma partilha justa

Contas conjuntas e herança — quem é o verdadeiro dono do dinheiro neste tipo de contas?

O óbito de um titular suscita dúvidas frequentes na sucessão, sobretudo quanto às contas bancárias. Contas partilhadas são frequentes entre cônjuges e familiares e, no momento da herança, surgem duas perguntas distintas: quem pode movimentar a conta perante o banco e quem é proprietário do saldo, total ou parcial. Confundir estes planos gera conflitos desnecessários.

No caso das contas singulares, a titularidade do saldo não deixa margem para dúvidas: todo o dinheiro pertence ao falecido e, por isso, integra o património da herança, devendo ser partilhado entre os herdeiros legais.

A complexidade surge quando estamos perante contas coletivas, que se subdividem em conjuntas ou solidárias. É aqui que nascem muitas dúvidas e potenciais conflitos, pois a possibilidade de movimentar os fundos nem sempre corresponde à titularidade do dinheiro.

Regra de ouro: movimentar não é ser dono

O facto de qualquer um dos titulares poder movimentar os fundos, nomeadamente nas contas solidárias, não significa que seja o verdadeiro proprietário do dinheiro. Como sublinhou a TRL em 12-02-2015:

“Qualquer dos titulares pode mobilizar os respectivos fundos depositados sem necessidade de intervenção dos demais titulares. (…) A solidariedade releva tão-somente, nas relações externas entre os titulares da conta e o banco, não tendo a faculdade de movimentação a ver com a propriedade das quantias depositadas.”

Em síntese, o regime da conta define como se movimenta perante o banco; a propriedade do saldo apura-se entre co-titulares e herdeiros, com base na origem dos fundos e nas presunções legais.

Tipos de contas bancárias e efeitos jurídicos

O contrato de abertura de conta bancária estabelece o tipo de conta e as suas regras:

  • Conta singular: apenas uma pessoa é titular da conta.
  • Conta coletiva solidária: qualquer titular movimenta isoladamente e o banco exonera-se pagando a um. Externamente há solidariedade, mas internamente aplica-se a presunção do artigo 516.º do Código Civil (partes iguais), ilidível por prova em contrário (artigo 350.º do Código Civil).
  • Conta coletiva conjunta: exige a assinatura de todos os titulares para movimentações. Se o banco aceitar operações apenas com uma assinatura, incorre em responsabilidade contratual e deve repor a situação. A TRG em 03-02-2022 confirmou que o débito sem todas as assinaturas gera incumprimento contratual e obriga à reposição do valor com juros.
  • Conta mista: combinações contratuais personalizadas, como a obrigatoriedade de uma assinatura para montantes superiores a determinado valor.

O óbito de um titular: o que acontece à conta?

Nas contas solidárias, o co-titular sobrevivo pode movimentar os fundos perante o banco, inclusive como cabeça-de-casal (artigo 2079.º do Código Civil). Contudo, essa faculdade não decide a propriedade. A TRL em 14-07-2022 clarificou que a titularidade patrimonial deve ser apurada em inventário, não pelo banco. Nas contas conjuntas, o óbito de um co-titular bloqueia automaticamente a movimentação e todas as assinaturas continuam a ser necessárias. Caso o banco permita movimentos sem elas, incorre em incumprimento contratual.

A quem pertence, afinal, o dinheiro?

A lei presume que o saldo pertence em partes iguais a todos os titulares da conta (artigo 516.º do Código Civil). Contudo, esta presunção pode ser afastada. Quem sustente percentagem distinta deve ilidir a presunção legal (artigo 350.º do Código Civil), demonstrando a origem dos fundos: salários, transferências, doações, rendimentos, heranças anteriores, entradas diferenciadas ou uso exclusivo para despesas de um só titular. A fração que efetivamente pertencia ao falecido integra a herança e deve ser incluída na partilha, respeitando a legítima quando existam herdeiros legitimários.

O que devem fazer os herdeiros?

Após o óbito, os herdeiros devem:

  1. Comunicar a morte ao banco: solicitar certidões de saldo à data da morte, cópia do contrato da conta, ficha-mandato e extratos de movimentos.
  2. Iniciar o processo de habilitação de herdeiros: apresentar a relação de bens, incluindo as contas bancárias, e recolher provas da origem dos fundos.
  3. Apurar no inventário a quota do falecido no saldo.
  4. Se a conta conjunta tiver sido movimentada sem todas as assinaturas, o banco pode ser obrigado a repor os valores.

Perguntas frequentes

O co-titular pode levantar todo o dinheiro e ficar com tudo?
Perante o banco, sim, no caso das contas solidárias. Mas isso não o torna proprietário do todo. Internamente, responde pelo que exceder a sua quota.

O banco é obrigado a bloquear a conta após saber do óbito?
Não existe uma regra automática. O banco deve cumprir o contrato de movimentação. Exigências fiscais ou declarações podem condicionar, mas não substituem a prova de propriedade.

Conclusão

A diferença entre quem pode movimentar os fundos e quem é seu legítimo proprietário é fundamental para evitar litígios. A prova da origem dos fundos é a chave para uma partilha justa. Para garantir que os direitos de todos são respeitados, é aconselhável procurar aconselhamento jurídico especializado.

A Cazos – Sociedade de Advogados presta apoio jurídico em matérias de sucessão, heranças e partilhas, assegurando que o processo decorra de forma clara, justa e legal.

Publicado em 26 de agosto de 2025 às 14:04Atualizado em 27 de agosto de 2025 às 07:47